Jinga de Angola: a rainha guerreira da África
HEYWOOD,
Linda M. Jinga de Angola: a rainha guerreira da África. Tradução de
Pedro Maia Soares. São Paulo: Todavia, 2019.
A autora do livro trabalhado é a professora da do
livro Linda M. Heywood é professora da Universidade de Boston, Massachusetts
(EUA), tendo seu estudo voltado para a História da África e Diáspora Africana
que deu origem à sua pesquisa de doutorado em História Africana pela
Universidade de Columbia. Possui trabalho na área dos estudos africanos na
África e na diáspora, que cimenta sua carreira em Universidade como em
Cleveland e Howard. Sua vasta experiência em diversas plataformas marca sua
vida profissional e acadêmica.
Partindo dessa proposta trazida por Linda M.
Heywood, o estudo foi direcionado para a leitura, discussão e registro da Introdução
e do 1. Capítulo - O reino de Ndongo e a invasão portuguesa - do
livro Jinga de Angola: a rainha guerreira da África. Quanto à estrutura,
a escrita está disposta em tópicos, organizando relatos, fatos e argumentos que
buscam a fundamentação da história da chegada da rainha Jinga ao centro do
poder político, social e econômico na África Central, nomeadamente, ao reino do
Ndongo, território que compreenderia hoje uma parte do norte de Angola.
Com essa base, ao longo do século XVII, o reinado
de Jinga foi marcado pela articulação política, as estratégias bélicas, os
estabelecimentos diplomáticos e as sofisticadas transações econômicas com
impactos, inclusive no tráfico de escravos para as Américas. Isso tudo ocorreu,
como se vê, também à altura das investidas coloniais portuguesas naquela parte
do Continente, que, mesmo diante de tal bem-sucedida governança, insistiam na
depreciação das formas de vida e organizações sociais - não assim consideradas
- desses africanos.
Apesar dos grandes feitos, Jinga foi reduzida, ou
melhor, aumentada em estereótipos animalescos com um legado de brutalidade,
selvageria, dada ao sexo como condenação crsitã, inclusive com uma dada
masculinidade, degenerada, incapaz de reger ao menos seus instintos guiados
pela barbárie de seu povo igual incivilizado. Tais palavras repetem-se, muda-se
apenas os nomes dos agentes, regentes, regidos, africanos vivendo em sociedades
não reconhecidas pela empresa colonial europeia. Disso já se sabe. O agravante
aí talvez seja a presença de uma mulher num lugar de poder tal qual o de
Elizabeth I na Inglaterra: como poderia? Era o visto. Era o não admitido em
primeira análise.
A referência é de uma primeira análise, pois a
narrativa do texto introdutório e do capítulo que se segue são, na verdade, uma
preparação para a nossa própria preparação para entender a relevância do
reinado de Jinga, mesmo que, com letramento mínimo, positivo ou negativo, do
alcance de suas representações, sobretudo, com perigo de arriscar dizendo de
vistas de relatos ao seu respeito nos século XVIII e XIX. Sobre
isso, há a proposição da autora de retomada
crítica dessas narrativas, bem como para a recuperação de outras fontes para o
estudo dessas histórias.
Fatos: Jinga astuta que conquistou o território de
Matamba, governou por três décadas, resistindo junto às forças coloniais e,
quando aliada estrategicamente aos europeus, além de estabelecer o cristianismo
no reino, comunicou-se com o papa à época, e foi, assim, reconhecida como
representante cristã no reino; prova de estratégia de poder através de alianças
religiosas.
Entretanto, para chegar a tal ponto e seguir depois
com o registro que é chamado de ascensão e queda do reinado, há que ser evocada
a história que antecede e proporciona a chegada de Jinga ao poder, uma espécie
de genealogia do poder, já que o poder foi mesmo geracionalmente entre esses
“nobres” africanos.
Nesses termos, o reino do reino de Ndongo passa a
ter sua história contada a partir de seus marcos temporais, geográficos e
sociais, que convergiram para o seu sucesso enquanto sociedade. Sua capital foi
Kabasa e seu governante era o Ndongo. Havia diversas províncias e todas eram
chefiadas ora por ngolas, macotas e sobas, por exemplo, dependendo da
hierarquia que ocupavam no âmbito administrativo e espiritual. Os ngolas nas
competências bélicas, por exemplo e os ngangas como conselheiros espirituais
com seus oráculos de ossículos, orientando as investidas das mais prósperas
para a sociedade.
Há também um destaque para as atividades
desenvolvidas pelas mulheres no reino, haja vista que o grande trabalho de
Jinga tenha tido referência também aí nas habilidades femininas nesses espaços
privilegiados, citando exemplos como o de Hohoria Ngola filha de Ngola Kiluanje
kia Samba, o fundador do reino do Ndongo em 1515, quando exerceu liderança
frente às adversidades inerentes ao trabalho com o poder centralizado, chegando
a uma ameaça de investida contra o reino do Congo
Há uma ênfase para grandes feitos militares,
políticos, religiosos, aumentando e protegendo fronteiras; conquistas que
antecedem a chamada invasão portuguesa. Esses contatos com os portugueses
geraram também, mas não num primeiro momento, a firmação de alianças
comerciais, tendo inclusive ido representação do reino à Lisboa para solicitar
missionários.
Delegações de uma fé portuguesas, como a de Paulo
de Novais, com o intermédio de emissário e depois de autorizadas pelo rei,
seguiam viagem, agora, protegidos pelas forças reais. Logo, seriam recebidos
pessoalmente pelo rei e a reação relatada é do assombro com a opulência da
morada, das vestes, dos adornos e das referências.
Mesmo com a percepção do poder ostentado pelo rei e
pelo reino do Ndongo, havia uma força colonizadora que permeou, não só os
tratados comerciais, que envolvia a negociação de armas, por exemplo, mas uma
força de conquista, de expansão mesma de Portugal, que ia se manifestando
através da construção de igrejas, fortalezas militares, o que apresentaria,
mais tarde, as conquistas portuguesas pela subjugação e desejo de integração do
poderoso reino à Portugal. E isso já estava na percepção do rei Ngola Kiluanje.
Antes disso, a religião. Poderosos aspergidos em
luxuosos cerimônias públicas com novos nomes, portugueses. Depois, estrategicamente, já que, em
declaração estavam Deus, o rei do Ndongo, o rei de Portugal, o rei do Congo,
estivessem o povo também prestigiado: 20 mil conversões, condenação da
poliginia, condenação do trabalho dos ngangas, fogo nos templos e nos “ídolos”:
enfim, batizados.
Pelos jesuítas, arma religiosa, relicários,
ladainhas, honra e glória à Nossa Senhora da Vitória que fez o reino vencer
guerras, logo logo, vassalos de Portugal, e a colonização foi sendo exercida de
diversas maneiras e em diversos graus, perdurando entre conflitos e alianças.
Vendo esse sistema colonial sendo retroalimentado,
o então rei Ngola Kilunaje voltou-se contra os portugueses, expulsando-os, já
que os cenários eram de guerras, mortes, mutilações, tráfico de pessoas,
inclusive para o Brasil.
Sem diplomacias, guerras eram declaradas entre Ndongo
e portugueses. Batalhas travadas como a de Kabasa e Talandongo em que
ocorreram ataques aos fortes; estratégias de guerra, estratégias de
fuga. Então, as sentenças de morte dadas pelo rei do Ndongo, o sacrifício de
pessoas, que eram abominadas pelos portugueses cristãos não chegavam perto da
atrocidade da mutilação de milhares de narizes enviados pelos portugueses aos
colonizadores para provar a bravura das tropas em batalhas.
Evidentemente, desarticulações internas do poder também
ocorreram, sobretudo no impacto causado pela irregularidade do pagamento de
tributos ao rei. Fidelidade e lealdade questionadas diante das alianças
internas entre os subordinados também.
Por narrativa, o que fazer, então, diante de tanta
calamidade que fez cessar até a chuva? Apenas forças superiores ao rei eram
mobilizadas em estados mais críticos ainda: o trabalho dos ngangas, que não foi
apagado, mas aumentado, para os que assim o criam.
Assim, entre a ameaça externa do poder da
ancestralidade real e os cerimoniais de chamamento de chuvas, a neta de
Kasenda, Jinga foi iniciada geracionalmete para reger uma outra etapa de
guerras e resistências do reino que teria sido dominado por Portugal, mas já
com anunciações de grandiosos entraves, que marcaram a história das lutas
anticoloniais naquela parte da África Central com sucesso para esta.
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